Talvez somente um semanário do quilate da New Yorker pudesse bancar a demora que Mitchell em geral levava para apurar, redigir e burilar suas matérias. "O professor Gaivota" (1942), primeiro perfil de Gould, por exemplo, ficou pronto após meses e meses de conversas. A possibilidade de ouvir Joe por um longo período decerto foi fundamental para a excepcionalidade dos perfis. Colaborou para isto também a complexidade do personagem. Gould não chamaria a especial atenção de Mitchell caso fosse simplesmente mais um dos boêmios que vagavam pelas ruas da cidade. O "professor Gaivota" descendia de uma família de médicos, formara-se na Universidade de Harvard, estudara a eugenia dos índios americanos e trabalhara como jornalista. Cheio de si, malgrado a sujeira e a aparência desleixada, dormia em estações de metrô e albergues baratos. Para se proteger do frio rigoroso do inverno, valia-se de folhas de jornais entre as roupas. Mesmo nesses momentos exalava esnobismo: "Só uso o "Times".
A qualidade literária de Mitchell faz dele um dos mais importantes jornalistas americanos do século XX.
Foto: Filme O segredo de Joe Gould
Marcela Oliveira
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